Não tem já o corpo solidão

03-07-2020

Não tem já o corpo solidão. A clausura recordemos, a casa consideremos, ouro, papel e vinho. Os canteiros dos vizinhos, junto às grades as hortênsias, claustros de reproduzir gatos. A vigília contra a noite, o uso e a hesitação, indo em sufoco despassarado o tempo. Alvorada ou diana, letargo ou desjejum. De improviso ou de rompante nos esgueiramos para as árvores, com voragem de floresta. Tanto viso, tanta brisa, damos costas a quem passa. Terra murada sem alento, em que excessos a peste pomos, de manso adeus a outra guarida, outro quarto de escrever, latifúndio entre paredes. Sou também as minhas posses, mais cadernos que ditames. Há quem fique, bem atento, há quem vá para narrar. A toada da frase seu intento é. Foi de cal, foi de calçada, a clausura recordamos, a nós consideramos, mais os hábitos que os monges. Foi prisão, foi privilégio, quando muito, outro tanto. Pois sem obrigação vos busco, vos dou conta do que penso. E logo vos desimpeço, a palavra é adeus. 

3 de julho de 2020

Ana Cláudia Santos (n. 1984)

Tem-se dedicado à escrita e à tradução de autores como Vico e Leopardi. Doutorada em Teoria da Literatura, tem exercido actividade profissional como editora numa instituição universitária. Publicado em 6-7-2020

A poetisa de Marc Chagall (1887 - 1985)

Copyright © 2020 Blog SOBRE O LADO ESQUERDO. Poesia & textos afins. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Webnode
Crie o seu site grátis! Este site foi criado com a Webnode. Crie o seu gratuitamente agora! Comece agora